O art. §1º do art.
557 do CPC dispõe que da decisão do relator que indeferir o recurso
manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou contrário
à súmula ou jurisprudência dominante do respectivo Tribunal, do STF
ou Tribunal Superior caberá agravo para que o recurso seja julgado
pelo corpo colegiado; este agravo, por sua vez, é denominado como
agravo regimental (V.). Muitas vezes, porém, sendo omissa ou
obscura a fundamentação apresentada pelo relator os advogados
interpõem embargos declaratórios, recurso este com a finalidade de
suprir estas deficiências antes da interposição do referido agravo,
acontecendo, no entanto, que o relator leve para o tribunal o
julgamento dos embargos no lugar de julgá-los unipessoalmente como
deveria ser, já que cuidavam os embargos apenas de esclarecer ou
suprir suposta falta de sua pessoal decisão. Se, neste caso, a
decisão for nomeadamente sobre os embargos, estará correto e regular
o processo, cabendo ao advogado interpor, finalmente, o agravo
regimental, para que a Turma examine, então, o recurso originário do
qual se interpôs os embargos; não obstante, se não estiver claro que
a decisão colegiada foi sobre os embargos, ou houver decisão sobre o
mérito do recurso original, uma confusão que funciona como armadilha
para os advogados estará instaurada, sobre o que discorremos a
seguir.
Se na decisão houver manifestação da Turma sobre o mérito do recurso
originário, ficará o causídico perplexo diante de fundada dúvida,
porque não há sentido algum em levar novamente à mesa, pela via do
agravo regimental, o julgamento daquilo sobre o que ela já se
manifestou, mas, por outro lado, se após esta decisão o advogado
ingressa com recurso especial ou extraordinário, fatalmente irão
estes ser repelidos com base na súmula 281 do STF ("É inadmissível o
recurso extraordinário, quando couber, na justiça de origem, recurso
ordinário da decisão impugnada."), ou seja, o Tribunal alegará que
não houve esgotamento das instâncias inferiores mediante a
interposição de todos os recursos cabíveis. Interpondo-se o agravo
regimental, pode ainda o tribunal inadmiti-lo afirmando que sim,
havia julgado o recurso original e consignar que, dada a
fungibilidade dos recursos, considerou os embargos como agravo
regimental, o que poderá implicar na perda de prazo para os recursos
extraordinário e/ou especial. Aí estará, pois, configurada uma
situação confusa, difícil de desembaraçar, para o advogado, fruto da
odiosa "jurisprudência defensiva", pela qual tudo se faz, raiando
inclusive a falta de ética judicante, para impedir recursos.
O que fazer? Em nossa opinião, a primeira coisa a ser feita é
ingressar com outro embargo declaratório para que o tribunal
esclareça sobre o que decidiu, a saber, se sobre os embargos ou o
próprio recurso original; tal providência, além de produzir a
interrupção do prazo para outro recurso, deixará o tribunal na
obrigação de explicar; se rejeitados os embargos, deixará
evidenciada a desídia do tribunal ao propositalmente criar uma
confusão pela qual não se pode apenar o recorrente, gerando, pois,
para este, a presunção de conduta processual escorreita; interpondo
então agravo regimental e nele constando a explicação de que o faz
para evitar a alegação de não esgotamento das instâncias referido na
citada súmula 281, e ainda aludindo ao fato de haver ingressado com
embargos para tentar esclarecê-lo, caso o tribunal rejeite o agravo
pelas razões acima (considerar que já julgara o recurso original
considerando os embargos como agravo regimental) deverá, pois, o
recorrente finalmente interpor os recursos especial e/ou
extraordinário, relatando toda esta confusão e fazer o mesmo no
agravo cabível caso estes sejam também inadmitidos, como forma de
transferir assim ao STF e STJ a obrigação de solucionar o impasse
causado por uma clara atecnia e incorreção do tribunal de origem.
Alguns, diferentemente, entendem que se deve ingressar com o agravo
regimental e os recursos especial e extraordinário ao mesmo tempo,
mas estes ver-se-ão prejudicados caso o agravo regimental venha a
ser admitido, isto, além de aumentar a confusão, incorre no perigo
de não ser conhecido o agravo regimental por já estar interposto o
recurso que lhe seria sucedâneo e venha aplicar-se a aludida
súmula.
A
solução deveria vir dos próprios tribunais e nos parece ser que, na
falta de norma processual específica, seja estabelecida por eles a
regra de que sempre que em sede de embargos declaratórios venha a
ocorrer isso, devem eles ser considerados como agravo regimental.
Sobre tal confusão diabólica merece registro o pronunciamento da
Ministra Nancy Adrighi no RESP 1.100.398 - RJ (2008/0233354-0):, que
conclui neste sentido
"Há, portanto,
grave equívoco do Tribunal ao proferir a primeira decisão, sobre
o mérito, unipessoalmente, e a segunda, que meramente a
esclarece, no colegiado. Ao fazê-lo, o Tribunal
impossibilita a identificação da natureza do decisum,
dificultando sobremaneira a decisão acerca de qual recurso
interpor. Afinal, nessas hipóteses a natureza da decisão
recorrida deve obedecer a forma adotada no início do julgamento
(unipessoal), ou no final (colegiada)?
Esse procedimento, que infelizmente tem se tornado cada vez mais
comum nos Tribunais, só tem causado mais dificuldades."
enfatiza a Exma. Ministra no mesmo aresto:
"Em hipótese
alguma poderia, o Tribunal, submeter ao colegiado os embargos de
declaração interpostos contra uma decisão unipessoal. Na pior
das hipóteses, poderia o Relator ter convertido os embargos de
declaração em agravo interno e ter levado o agravo, e não os
embargos, a julgamento pela Turma. Proceder da forma escolhida
pelo Tribunal a quo não encontra respaldo na legislação
processual e só faz gerar confusão para o advogado da parte
que, sem poder se apoiar nas disposições do CPC. O
Processo Civil tem de ser, na medida do possível e desde que
respeitadas as garantias constitucionais conferidas às partes, o
mais descomplicado possível. A idéia é a de que o processo
amplie, e não restrinja o acesso ao Judiciário. O
procedimento não pode ser um labirinto cheio de becos sem saída.
É necessário que o procedimento dê segurança às partes e a seus
advogados."
Leia-se ainda a ementa:
"EMENTA PROCESSUAL
CIVIL. PRELIMINAR. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO, INTERPOSTOS CONTRA
DECISÃO UNIPESSOAL DO RELATOR, JULGADOS PELO ÓRGÃO COLEGIADO DO
TRIBUNAL A QUO. AGRAVO INTERNO NÃO CONHECIDO. PEDIDO DE ANULAÇÃO
DO ACÓRDÃO. INDEFERIMENTO. MÉRITO. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA
GRATUITA. INDEFERIMENTO. SUFICIÊNCIA DE ATIVO PATRIMONIAL.
REEXAME DE PROVAS.
I.- Hipótese em que o Agravo de Instrumento interposto pelos
recorrentes contra a decisão que indeferiu o pedido de
assistência judiciária gratuita foi julgado por decisão
unipessoal do Relator, decisão essa atacada por Embargos de
Declaração, que, por sua vez, foram julgados pelo Órgão
Colegiado. Sobrevindo a interposição de Agravo Interno, este não
foi conhecido em razão do descabimento de Agravo Inominado
contra decisão do Colegiado.
II.- As partes não têm responsabilidade pelo
desconcatenamento dos atos processuais internos no Tribunal,
iniciados com a não decisão dos Embargos de Declaração pelo
Relator, que já os submeteu ao Órgão Colegiado, seguindo-se o
descontrole entre colegialidade e unipersonalidade, e não
podem, por isso, ser apenadas com enorme prolongamento da
questão interlocutória –o que ocorrerá se sobrevier, agora,
anulação do julgado, para retorno à origem e novo julgamento,
com novos recursos.
III.- O Relator, na decisão unipessoal, é representante do
órgão Colegiado que integra, de maneira que aquilo que o Relator
decide deve corresponder ao pensamento já pacificado do órgão
colegiado, como se tivesse sido decidido por este."
Verdade é que no desiderato de celeridade estamos vivendo uma época
de anarquia judicante travestida de simplificação do processo civil,
pelo que, sob o pretexto de louváveis intenções como a razoável
duração do feito os julgadores fazem de tudo: embargos de declaração
decididos numa etiqueta, uso da jurisprudência que firmou a
desobrigação dos juízes de enfrentar todos os argumentos que é
invocada indevidamente para negligenciar de forma intelectualmente
covarde a apreciação daquilo que poderia fulminar o que o magistrado
afirma para decidir, decisões sem base legal ou fundadas em
pretensos princípios, por vezes contrarias à própria norma, etc.
Tudo isto fica pior ainda quando, para fazer o que bem entendem, os
juízes apresentam decisões embebidas na falsa idéia de buscar o
"justo" ou "a justiça" mais além da lei, como se o texto legal fosse
secundário e não emanado do Estado Democrático de Direito sendo
cabível ao magistrado encontrar por sua conta a "justiça" que a
legislatura não foi capaz de encontrar. Tal capacidade pretendida
por alguns juízes não dista muito daquela outrora conferida ao
demiurgos ou semi-deuses. O exercício da advocacia nestá, neste
contexto, cada vez mais difícil.
(verbete escrito pelo atualizador)